TEMPERANÇA
Roberto Camilo Órfão Morais
Diante de tanta incerteza e imprevisibilidade que estamos vivendo, recorro ao pensador inglês do século passado C.S. Lewis, que demonstrou, de forma genial e criativa em seus livros (Cristianismo Puro e Simples, Crônicas de Nárnia etc.), a necessidade de se resgatar o que ele chamou de Lei da Natureza Humana: algo que existe de verdade, que não é inventado por nós, mas inerente a nós.
Nesse sentido podemos encontrar o que se convencionou chamar de virtudes cardeais. A palavra cardeal vem do Latim e significa “dobradiça da porta”; peça ao redor da qual gira algo crucial. São virtudes cardeais a Prudência, Temperança, Justiça e Fortaleza.
Tendo em vista tanta incontinência verbal, difundida principalmente nas redes sociais, em pronunciamentos chamados “oficiais” que tem inclusive levado à população ao desespero, penso que se faz necessário uma reflexão sobre a pertinência da Temperança, na convivência entre todos nós brasileiros.
Primeiramente, faz necessário desconstruir ideias errôneas, pejorativas em relação à Temperança, que a considera sinônimo de mediocridade ou de conformismo. O seu verdadeiro sentido consiste não em excesso ou em carência. Segundo diferentes vertentes da filosofia, Temperança é a moderação pela qual permanecemos senhores de nossas próprias vidas; é um meio de nossa independência. Não é um sentimento, mas vontade, um poder, uma virtude.
O desafio que se apresenta no momento atual, é que estamos em um mundo marcado pela velocidade, onde nada é permanente, nada é para durar, tudo é líquido. Não sabemos nos contentar nem mesmo com o excesso, gerando ansiedade, frustração e não o gozo doce do prazer. Nada é suficiente para quem o suficiente é pouco, já ensinava o filósofo Epicuro, na antiguidade grega, no séc. IV a.C.
Um alcoólatra não tem o prazer de saborear uma bebida, pois ele tem com ela uma relação de dependência. Segundo Montaigne, a intemperança é a peste da volúpia sendo que a temperança não é seu flagelo e, sim, o seu tempero; ou seja, sem este tempero não é possível desfrutar o bem fluir da vida e, simultaneamente, se manter livre, com autonomia sobre os desejos, sobre o próprio ser.
Buscar a Temperança não é algo fácil, e isso explica tantos desencontros pela vida. – “Como enfrentar tudo isso”?, fico a me perguntar. Um bom caminho penso que é a reflexão do paradoxo de G. K. Chesterton, que dizia ser o pecado uma virtude enlouquecida, assim sendo, para Alceu Amoroso Lima, em todo bem há uma virtualidade de mal; como em todo mal, uma semente do bem. Portanto, o grande segredo do bem viver é saber distingui-los, saber separar o joio do trigo.
Para saber fazer esta distinção é necessário a Temperança, inerente a Natureza Humana, presente ao longo da história, em diferentes culturas e diferentes tradições religiosas. A Temperança é uma das ações da Graça sobre a Natureza humana, expressão da essência da mensagem cristã, que deve estar presente em nosso cotidiano, em nossa prática de relacionamento social.