domingo, 24 de novembro de 2024

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LAGO DE FURNAS: Região vem sendo prejudicada sistematicamente ao longo dos anos

Quando JK idealizou Furnas, em 1957, pensou em livrar o Brasil do racionamento elétrico, mas alterou a vocação econômica da região

Reginaldo Lopes
Deputado Federal

Com o Brasil numa situação de nau sem rumo, até as águas são prejudicadas. É o caso do lago de Furnas, que margeia 34 municípios mineiros e é o maior espelho-d’água da América Latina, ficando conhecido como “Mar de Minas”. A escassez hídrica aprofundou a grave crise que já vivia seu entorno. O governo federal anunciou que vai priorizar o uso da água do complexo de usinas para geração de energia elétrica, o que vai prejudicar ainda mais a economia da região, baseada no seu balneário turístico.

O problema não vem de hoje. No fim do ano passado, um manifesto divulgado pela Associação dos Municípios do Lago de Furnas (Alago) já denunciava que a “omissão e/ou a ação desastrosa das autoridades gestoras de recursos hídricos no país levaram o Lago de Furnas a uma situação de absoluta precariedade, desolação e pobreza”. O grande problema é o nível baixo das usinas, que impossibilita as atividades turísticas e agrícolas. A cota mínima de água para o uso múltiplo é de 762 m acima do nível do mar, mas a altura atual está em 757,4 m, com defasagem de 4,6 m.

Em dezembro do ano passado, foi aprovada na Assembleia Legislativa a Emenda Constitucional 106, que decretou o tombamento dos reservatórios dos lagos de Furnas e de Peixoto e tornou obrigatória a manutenção da cota mínima para “assegurar o uso múltiplo das águas para o desenvolvimento do turismo, da agricultura e da piscicultura, a par da geração de energia”. Mas o governo federal acionou o Supremo Tribunal Federal (STF), contestando a constitucionalidade dessa PEC.

Antes da questão energética, outra destinação já esvaziava o lago. A água de Furnas vem sendo desviada para abastecer a Hidrovia Tietê-Paraná, em São Paulo. Para o seu canal suportar barcaças com maior capacidade de carga, a hidrovia passou a absorver um maior volume para aumentar a sua altura.

Os empresários que exploram o transporte hidroviário foram contemplados em detrimento da economia das cidades mineiras. Milhares de empreendimentos turísticos não resistiram ao prejuízo causado pela pandemia da COVID-19 e pela seca do lago e foram paralisados ou extintos, gerando um desemprego em massa.

Pela importância do lago de Furnas, sua gestão teria que ser compartilhada, e não centralizada no governo federal. É necessária a criação de um consórcio público entre a direção da usina e as 34 prefeituras, que funcionasse como uma agência de desenvolvimento, garantindo a funcionalidade das múltiplas funções que o lago proporciona.

Exemplos pelo mundo comprovam o potencial de agências que coordenam o multiuso de lagos artificiais. É o caso da Autoridade do Vale do Tennessee, nos Estados Unidos, que foi criada junto com a inundação da região desértica no início do século passado, construindo uma potente zona de desenvolvimento. O Brasil quis seguir o caminho estadunidense, mas, ao contrário de lá, por aqui os 1.440 km² de terras inundadas foram em áreas fertilizadas por milhões de anos, com matéria orgânica carreada das montanhas pelas chuvas até assentarem nas várzeas.

Quando Juscelino Kubitschek idealizou Furnas, em 1957, pensou em livrar o Brasil do racionamento elétrico, mas alterou a vocação econômica da região de sua instalação, que vivia da agricultura e passou a ser dependente do turismo. Agora, com o esvaziamento do lago, este setor está à beira da falência, colocando milhares de famílias em dificuldades. Algo urgente precisa ser feito para protegê-las.

[Texto publicado originalmente no jornal O TEMPO].