sábado, 23 de novembro de 2024

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DOS FUNDOS DO QUINTAL (I) – “Das simplicidades à singeleza”

DOS FUNDOS DO QUINTAL (I)

Das simplicidades à singeleza

Do fundo do meu quintal, onde resido, arbustos e ervas daninhas crescem, enquanto os sinos do Santuário badalam. Dicotomia.  Feiura e boniteza. Mas a correria do dia a dia me impedia em ver que a beleza, que ali, haveria ser produzida, sacramentada.

Quando pelo começo da pandemia, relutei muitas vezes em plantar canteiros de verduras e legumes. Algo para preencher o tempo. Não sabia que tinha um vazio no coração. Não o percebia.  A psicoterapia explica bem, a isso.

Teimoso, não me atentava aos detalhes. Faltava-me a acuidade da sensibilidade em contemporizar que, do ‘terreno em matos’, existencialmente falando, podem emergir ‘canteiros de vida’. Porque meu ‘terreno existencial’, inconsciente, estava cheio de ‘matos’.

Mas não deu certo, essa teimosia. Em dado momento, não tive mais como fugir dessa reconstrução humana, que me apelava à vida! Desconstituição e reconstituição do sujeito psíquico.

Dado dia, contratei colaboradores, empresa de transporte e descarte ecológico de entulhos. Fizemos uma grande limpeza (a cada entulho retirado, via eu, no meu interior, uma limpeza existencial) e, após, semanas, lentamente, produzi, com a mãe natureza e, aprendizado de meus antepassados, canteiros de hortaliças e legumes.

Produzir algo com a Mãe Terra, é um louvor à vida!

Tudo ficou limpo e, cuidei (corpo, alma, terra) – com o cuidado que temos em ter com a própria Mãe Terra. Lembrei-me que plantei ao lado da capela, de um lado, um pé de ipê com o umbigo do primeiro filho e, ao outro lado – do lugar sagrado, um pé de manacá, com o umbigo do segundo filho.

Já haviam oito meses de pandemia. Comecei-me a curar da doença do ‘isolamento’, com a produção de uma horta de legumes e hortaliças vigorosas. Ao produzir a horta, produzia-me, em mim mesmo; aprendendo que, antes pandemia, já vivia um isolamento social, no meu coração. Como dantes era cego…

Lentamente, foi-me construída a consciência sana, de que estava eu próprio, limpando os fundos de meu ‘quintal existencial’. Introspecção no inconsciente. Tudo em mim se reconstituía, lentamente, como ‘tirar’ a semente da “dormência” (período de germinação). Me fecundei na própria terra, como voltar ao útero da que me gerou e, que a retornei, um dia, há quase vinte anos, à Gaia.

A psicanálise é primaz nisso. Nos ‘cutuca’ naquilo que não queremos pensar:  não queremos ‘mexer’, na bagunça que temos no ‘fundo da nossa história’ – no ‘fundo de nosso quintal’.

Interessante descobrir que, eu já era isolado, fora o tempo pandêmico – meu Deus, eu já o, era. Precisava então me recuperar. Contraditório: agora isolado, recuperar-me do isolamento. – Ressignificar.

Observei-me, no trato do “cuidado”, para com as hortaliças que, cresciam, suas folhas, ou se abraçavam ou, se amparavam: ‘abraço e / ou, ombro amigo?’. Tem aqui uma dicotomia? Ou uma ressignificância?

Mas, como todo distanciamento, busca a proximidade àquilo que nos é distante, chegou um momento em que não resisti. “Mexi no fundo de meu ‘quintal’ existencial”.

Jamais poderia imaginar que, essa horta traria tantos significados, ao cuidar – regar em tantos longos dias (hortaliças e minha alma); como também, tirar as ‘ervas daninhas’ da minha existência humana.

Alexandre da Fonseca, Neuropedagogo, graduado em Pedagogia e Filosofia.